O Sudário de Turim
Seria esse o lençol que cobriu o corpo de Jesus Cristo?
O Mistério e o Fascínio do Sudário
A ciência revela: o lençol de Turim não é uma fraude. E retoma o estudo da mais famosa relíquia do mundo
Por José Tadeu Arantes ( E-mail: jtadeu@edglobo.com.br )
"Caindo a tarde, veio um homem...chamado José ... Este foi ter com Pilatos e lhe pediu o corpo de Jesus. Então Pilatos mandou que lho fosse entregue. E José, tomando o corpo, envolveu-o num pano limpo de linho."
( Mateus 27.57 a 59 )
"Este ( José) baixando o corpo da cruz, envolveu-o num lençol que comprara, e o depositou em um túmulo..."
( Marcos 15.46 )
(José )...pediu o corpo de Jesus e, tirando-o do madeiro, envolveu-o num lençol de linho..."
( Lucas 23. 52,53 )
"( Após a ressurreição ) Pedro...correu ao sepulcro. E, abaixando-se, nada mais viu senão os lençóis de linho; e retirou-se para casa, maravilhado do que havia acontecido."
( Lucas 24.12 )
"Tomaram, pois, o corpo de Jesus e o envolveram em lençóis com os aromas, como é de uso entre os judeus na preparação do sepulcro."
( João 19.40 )
"Saiu, pois, Pedro e o outro discípulo ( João ), e foram ao sepulcro...e chegou primeiro e, abaixando-se, viu os lençóis de linho; todavia não entrou. Então Simão Pedro, seguindo-o, chegou e entrou no sepulcro. Ele também viu os lençóis, e o lenço que estivera sobre a cabeça de Jesus, e que não estava com os lençóis, mas deixado num lugar `a parte."
( João 20. 3 a 7 )
O Sudário,
tal como aparece a olho nu
O Sudário de Turim - uma peça de linho que a tradição diz ser o lençol
mortuário de Jesus - abriga polens de plantas que só existem na região de
Jerusalém e cuja data é anterior ao século 8 d.C. - podendo provir de épocas
bem mais antigas.
A informação foi divulgada, em agosto último, pelo botânico Avinoam Danin, da Universidade Hebraica de Jerusalém. Ela derruba definitivamente a tese de que o Sudário seria uma falsificação produzida na Europa durante a Idade Média. Essa idéia, comunicada de maneira sensacionalista em 1988, baseava-se numa única prova: a datação da relíquia, realizada pelo método do carbono 14, que fixou como período de sua fabricação os anos compreendidos entre 1260 e 1390 d.C. A opinião pública embarcou nessa tese, sem atentar para os seguintes fatos:
1 - O Sudário já passou por milhares de testes
2 - De todos os experimentos, só o do carbono 14 contestou a autenticidade da peça
3 - Os especialistas se opuseram à utilização dessa técnica, devido à grande contaminação que o pano sofreu ao longo dos séculos
4 - Harry Gove, o principal responsável pela datação, admitiu que a contaminação podia ter falseado os resultados do teste.
A idéia da falsificação está agora descartada
A existência dos polens era conhecida pelos pesquisadores desde 1973, mas essa informação foi atropelada pelo rolo compressor do teste do carbono 14. Ela devolve ao estudo do Sudário a seriedade que o assunto merece. E chama a atenção para um "detalhe" que os autores da tese da falsificação se esqueceram de explicar: como foi produzida a imagem gravada no tecido?
A Síndone ( outro nome pelo qual é conhecido o Sudário, derivado da palavra grega sindón, que significa lençol ) apresenta uma imagem muito tênue e invertida. Ela é reinvertida e revela detalhes espantosos, quando observada no negativo fotográfico. Esse fato causou enorme surpresa ao advogado italiano Secondo Pia, que, em 1898, fez a primeira foto do lençol. Surpresa ainda maior ocorreria quase cem anos mais tarde, em 1974, quando se descobriu que a imagem comportava também uma informação tridimensional. Verificou-se que era possível relacionar de maneira rigorosa a intensidade das marcas produzidas no tecido com a distância que supostamente havia separado pontos do pano do corpo morto. Com base nisso, dois pesquisadores americanos, John Jackson e Eric Jumper, utilizando um computador da Nasa, fizeram, em 1978, uma reconstituição volumétrica integral do corpo. Não se conhece nenhuma imagem como essa. Para alguns, ela é uma prova da ressurreição de Jesus. Para outros, continua sendo um mistério insondável. A ciência ainda está longe de explicá-lo. Mas já lançou muita luz sobre ele, como se verá nas páginas a seguir.
O homem - Marcas do açoite e da crucifixão
O lençol apresenta uma imagem dupla, ventral e dorsal, de um homem nu, em tamanho natural. Os pesquisadores americanos Kenneth Stevenson e Gary Habermas calculam que ele tinha entre 30 e 35 anos, aproximadamente 1,80 m de altura e 79 kg de peso. "Era um homem musculoso, habituado ao trabalho manual", afirmam. Dale Stewart, do Museu Smithsoniano de História Natural, dos Estados Unidos, diz que a barba, o cabelo e os traços faciais são característicos do grupo racial semita.
Cabelos trançados
O historiador inglês Ian Wilson foi o primeiro a chamar a atenção para o formato da longa mecha de cabelo que cai sobre o meio das costas. Ela assemelha-se muito a uma trança desmanchada. Trançar os cabelos atrás do pescoço era uma moda comum entre os homens judeus do tempo de Jesus. As numerosas marcas de ferimentos que aparecem no homem do Sudário revelam que ele foi brutalmente açoitado, coroado com espinhos, crucificado e perfurado com lança do lado direito do tórax. Pierre Barbet, cirurgião do hospital Saint-Joseph, de Paris, e outros especialistas em anatomia e medicina legal antes e depois dele estudaram exaustivamente essas marcas. E concluíram que elas correspondem, nos mínimos detalhes, às narrativas sobre a flagelação, morte e sepultamento de Jesus que aparecem nos Evangelhos. E que acrescentam informações desconhecidas pela tradição cristã, mas confirmadas pela recente pesquisa histórica e arqueológica - como o fato de o crucificado ter sido pregado à barra horizontal da cruz pelos pulsos e não pelos meios das mãos. É impossível acreditar que falsificadores medievais pudessem saber de tudo isso. Além de dominar uma técnica de impressão sem paralelos na história, eles precisariam ter conhecimentos de arqueologia, história, anatomia e fisiologia que só se tornaram disponíveis no século 20.
A imagem dramática que aparece no negativo fotográfico
Entre 1978 e 1981, um grupo internacional de cientistas do mais alto nível, reunidos no Projeto de Pesquisa do Sudário de Turim, dedicou, em conjunto, quase 150 mil horas de trabalho à análise do lençol mortuário. E chegou à conclusão de que a figura que nele aparece não é uma representação, mas uma imagem misteriosamente produzida pelo corpo que ele envolveu. Este apresenta uma grande quantidade de feridas, com uma precisão de detalhes simplesmente espantosa. É o caso, por exemplo, dos halos formados em torno das manchas de sangue, decorrentes da separação entre a parte sólida e o soro. Segundo os pesquisadores do projeto, o corpo exibe sinais indiscutíveis de morte e rigidez, mas nenhum indício de decomposição - informação que foi interpretada por muitos como uma das provas da ressurreição.
O "mapa" do Sudário, feito sobre o negativo fotográfico do lençol, revela os seguintes elementos:
queimaduras devidas ao incêndio que danificou o Sudário em 1532;
remendos aplicados, em 1534, sobre as partes destruídas do tecido;
manchas produzidas pela água utilizada para apagar o fogo;
ferimentos causados pelos açoites nas costas; gotas de sangue provocadas por perfurações na cabeça; ferida decorrente do traspassamento do pulso esquerdo; rastros do sangue que escorreu pelos antebraços durante a crucifixão; ferida causada por traspassamento no lado direito do tórax; rastro do sangue que escorreu da ferida do tórax; mancha de sangue resultante do traspassamento dos pés; contusão produzida pelo transporte da barra horizontal da cruz (círculos nas costas).
O pano
Fibras que não existiam na Europa
A
reconstituição volumétrica do rosto do Sudário, feita por computador
O Sudário é uma peça contínua de puro linho, com 4,36 m de comprimento, 1,10 m de largura e 0,34 mm de espessura. O pano, produzido em tear manual, é muito rústico. E as técnicas de fiação e tecelagem nele utilizadas eram amplamente difundidas no Oriente Médio, na época de Jesus, tendo sido encontrados vários similares. A celulose das fibras apresenta-se degradada. E o tecido, originalmente branco-marfim, exibe uma coloração amarelo-palha, por efeito de oxidação.
Além do linho, a Síndone contém vestígios de fibras de um tipo de algodão do Oriente Médio, o Gossypium herbaceum. Isso leva a crer que o pano tenha sido tecido num tear previamente utilizado na confecção de peças de algodão. O que é mais um argumento a favor da origem oriental do Sudário, pois, como lembra John Tyrer, pesquisador do Instituto Têxtil de Manchester, Inglaterra, o algodão não era cultivado na Europa, durante a Idade Média.
A impressão
A luz ofuscante que chamuscou o lençol
No esforço quase irracional de negar a autenticidade do Sudário, alguns estudiosos lançaram mão de todo tipo de hipótese para explicar a formação da imagem: pintura, compressão do tecido sobre o corpo de um cadáver untado com óleos, frotagem do linho sobre um baixo-relevo e até uma fotografia produzida em plena Idade Média.
Nenhuma dessas idéias resistiu às análises científicas. As pesquisas mostraram que:
1 - a imagem não apresenta contornos nítidos, nem linhas que seguem direções preferenciais, como ocorre com todo o desenho, pintura ou frotagem;
2 - apesar de o linho ser fino, a imagem é superficial e não aparece do outro lado do pano, ao contrário do que aconteceria com uma pintura, compressão ou frotagem;
3 - não há vestígios de pigmentos, tintas ou vernizes, nem da difusão de líquidos através da trama do tecido (exceto nas marcas de sangue e nas manchas de água);
4 - a imagem não apresenta as deformações que seriam inevitáveis se o lençol tivesse sido comprimido sobre um cadáver (nesse caso, devido à tridimensionalidade do corpo, partes como o nariz, por exemplo, produziriam uma impressão bem mais larga do que o normal);
5 - a imagem dorsal não é mais intensa nem mais profunda do que a frontal, o que seria de se esperar no caso de uma impressão por contato; ambas têm características idênticas, como se, no instante da formação da figura, o corpo, deitado, apresentasse peso zero!
6 - o tratamento da imagem por computador produziu uma forma tridimensional proporcionada e sem distorções, o que jamais ocorre em casos de pintura ou fotografia.
O Brilho Emanou do CorpoDescartadas todas essas hipóteses, como explicar a impressão? Alguns cientistas sugerem que uma imagem como essa só poderia ser produzida se, numa fração de segundo, o corpo tivesse emitido um clarão equivalente ao da luz solar ou de uma explosão nuclear, como a da bomba de Hiroshima. Pela análise da figura, conclui-se que essa luz não foi refletida pelo corpo, como ocorre numa fotografia, mas emanou dele mesmo, chamuscando o pano!
Sinais que confirmam narrativa da Bíblia
Alguns
estudiosos já chamaram o Sudário de "O Quinto Evangelho". Pois,
tanto quanto os textos de Marcos, Mateus, Lucas e João, ele forneceria
informações preciosas sobre a tortura, a morte, o sepultamento e a
ressurreição de Jesus. A diferença é que esse evangelho puramente visual
quase nada oferece ao olhar apressado e desatento. Ele exige uma observação
respeitosa, acurada e paciente, de preferência mediada pelos óculos da
ciência. Aí, sim, o Sudário apresenta uma quantidade esmagadora de
informações. E desvela a história de um sacrifício capaz de emocionar até o
mais insensível dos observadores. É difícil sair ileso do confronto com as
lições desse pano milenar:
A coroa de espinhos não era uma simples tiara, mas um artefato que cobria a cabeça toda. O soldado que a urdiu deve ter usado seu próprio capacete como molde. Os espinhos, com 5 centímetros de comprimento, causaram 72 perfurações na cabeça.
A flagelação foi tão brutal que, por si só, teria matado uma pessoa mais frágil. Ela acelerou a morte do homem do Sudário, abreviando sua permanência na cruz. Foram contados de 90 a 120 ferimentos causados pelo açoite! A forma das feridas corresponde às produzidas pelo flagrum, o chicote romano.
Os condenados não carregavam a cruzes completas, mas apenas as barras horizontais. Os mastros ficavam pré-fixados no local de execução. Mesmo assim, o transporte da trave provocou grandes hematomas nas costas do homem do Sudário. E quedas ao longo do percurso machucaram seus joelhos e rosto. A rótula esquerda e o nariz apresentam contusões graves - com a provável separação da cartilagem nasal.
Os pregos não foram fixados no meio das mãos, como se pensa. Mas numa parte do pulso conhecida pelos anatomistas como "espaço de Destot". Se o traspassamento tivesse ocorrido no meio das mãos, estas teriam rasgado com o peso do corpo. Ao passo que, no "espaço de Destot", a introdução dos pregos assegurava uma fixação firme à cruz. A perfuração dos pulsos seccionou os nervos medianos, provocando a retração dos polegares. Estes estão dobrados para o interior das mãos na figura do Sudário.
O poste da cruz não era alto. E a barra horizontal se encaixava nele por meio de uma fenda. O estudo dos rastros de sangue mostra que o homem foi pregado à barra sobre o chão, sendo depois alçado até o topo do mastro. Seus pés - o esquerdo sobre o direito - foram fixados ao poste por um único prego, de cerca de 18 centímetros.
As moedas - Objetos do tempo de Pôncio Pilatos
A imagem tridimensional, produzida por computador, trouxe um argumento espetacular a favor da autenticidade do Sudário. Sobre as pálpebras do homem foram descobertos dois objetos arredondados, que não são visíveis a olho nu nem no negativo fotográfico. O pesquisador americano Francis Filas, da Universidade Loyola, de Chicago, identificou um dos artefatos: trata-se de uma moeda, o dilepton lituus, produzida na Palestina sob o governo de Pôncio Pilatos, entre os anos 29 e 32 d.C. O segundo objeto foi identificado pouco depois: uma outra moeda, cunhada por Pilatos em homenagem a Júlia, mãe do imperador romano Tibério, em 29 d.C. Colocar moedas sobre os olhos do morto, para manter as pálpebras fechadas, fazia parte dos ritos funerários judaicos da época de Jesus.
O incêndio - As Chamas Que Danificaram a Relíquia
O Código
de Pray aparece na parte inferior da imagem
O que primeiro chama a atenção de quem olha o Sudário é um conjunto de manchas simétricas, dispostas ao longo de duas linhas longitudinais, que percorrem o pano de uma extremidade à outra. Elas são conseqüência do incêndio que, na noite de 3 para 4 de dezembro de 1532, queimou a capela do castelo de Chambéry, na França, onde estava guardada a relíquia. Dobrada em 48 camadas, o Sudário encontrava-se então dentro de uma caixa de madeira fechada, revestida de prata por fora e de veludo por dentro. Derretida pelo calor, a prata gotejou sobre uma das bordas do tecido, produzindo uma queimadura que, devido às dobras, danificou simetricamente o Sudário.
A chamada área da imagem, felizmente, foi pouco atingida. Mas alguns pedaços do pano queimaram completamente, tendo sido remendados, dois anos mais tarde, pelas freiras Clarissas da capela de Chambéry. Além do fogo, também a água utilizada para apagar o incêndio produziu marcas no Sudário, formando halos ao longo do eixo central e nas margens longitudinais do pano. Um desses halos formou-se exatamente acima da cabeça da figura, outro no plexo solar e um terceiro na região dos joelhos, dando à imagem um aspecto ainda mais hierático e misterioso.
O Sudário apresenta também quatro grupos de pequenos furos, resultantes de uma queimadura bem mais antiga. O Código de Pray, um manuscrito de 1192-1195 ( portanto anterior à suposta idade do Sudário estabelecida pelo teste do carbono 14 ), mostra o corpo morto de Jesus envolvido num pano que exibe furos idênticos aos do Sudário. Parece óbvio que o autor desse manuscrito o utilizou como modelo.
O Carbono 14 - Como a Fumaça Confundiu o Exame
Há uma enorme probabilidade de que a fumaça produzida durante o incêndio de Chambéry tenha contaminado o Sudário, depositando em suas fibras o carbono de outras substâncias presentes. Isso é mais do que uma simples hipótese. Pois o cientista russo Dmitri Kuznetsov, prêmio Lênin de ciência, resolveu reproduzir as mesmas condições em laboratório. "Apareceu com clareza uma grande troca entre o gás carbônico do ambiente e o tecido, a qual modificou o conteúdo de carbono 14 do último", disse. "A troca foi bem elevada: cerca de 25% do total. Isso falseou os resultados do exame, e, realizado o teste com radiocarbono, o linho pareceu muito mais recente do que era na realidade." Esse experimento, por si só, desqualifica completamente a datação do Sudário feita pelo método do carbono 14.
Os polens - Traços Deixados Pela Coroa de Espinhos
O botânico israelense Uri Baruch analisou o pólen achado no Sudário e concluiu que ele provém de plantas que só podem ser encontradas numa única localidade do mundo: a região de Jerusalém. E numa única época do ano: os meses de março e abril. Um desses polens corresponde à espécie Gundelia tournefortii que, segundo os especialistas, teria sido utilizada na confecção da coroa de espinhos. Polens desta e de outras espécies também foram encontrados no chamado Sudário de Oviedo, um lenço guardado na cidade do mesmo nome, na Espanha. De acordo com vários estudiosos, essa peça de linho, de 83 por 52 centímetros teria sido colocada sobre o rosto de Jesus, já recoberto pelo Sudário. De fato, o Evangelho de João refere-se a mais de um pano funerário (capítulo 20, versículos 6 e 7) e as pesquisas mostraram que os vestígios presentes nos dois tecidos coincidem perfeitamente. Entre esses vestígios, foram identificadas 70 manchas de sangue, que se sobrepõem de maneira exata. Como a existência do Sudário de Oviedo é documentada desde o século 8, os pesquisadores israelenses concluíram que o lençol de Turim não poderia ser posterior a essa data.
A existência dos polens orientais não é novidade para os estudiosos. Em 1973, o criminologista suíço Max Frei recolheu diversas amostras do pó acumulado entre as fibras do Sudário. E constatou a existência de polens de nada menos que 58 variedades diferentes de plantas. Algumas dessas plantas são comuns na França e Itália - o que não causa surpresa, já que durante muito tempo o lençol ficou abrigado nessas regiões. Mas há também polens de plantas características da Turquia oriental, confirmando a tradição de que, antes de chegar à Europa, o Sudário permaneceu durante séculos em terras bizantinas. Mais importante ainda: em sua lista, Max Frei identificou polens não de uma ou duas, mas de várias espécies de plantas que são típicas da região de Jerusalém ou em outras áreas dos territórios israelense e palestino.
As marcas da agonia e do sepultamento
A morte na cruz era causada por lenta asfixia, provocada pela posição dos braços. A imagem do Sudário mostra que o homem se ergueu várias vezes para tomar ar. Visando acelerar a morte, era costume quebrar as pernas dos condenados, impedindo tal movimentação. Isso não ocorreu neste caso - o que concorda com o relato dos Evangelhos, segundo os quais nenhum de seus ossos foi quebrado.
A estocada de lança, que era um golpe de misericórdia, ocorreu quando o homem já se encontrava morto. O Sudário mostra que ela produziu um forte jato de hemácias (a parte vermelha do sangue), seguido de um fluxo de plasma (a parte clara) - prova de que grande quantidade de sangue se acumulou e decantou no pericárdio. Isso converge com a texto bíblico, que fala num jorro de "sangue e água".
A deposição da cruz também ficou registrada no pano de linho. Nas manchas de sangue existentes na região dos pés percebe-se nitidamente as marcas dos dedos das mãos de uma das pessoas que sustentou o morto na descida do patíbulo. "Seriam os dedos do apóstolo João?", perguntam-se alguns estudiosos.
O sepultamento foi feito após uma preparação sumária do corpo. Se ele tivesse sido lavado, conforme o costume judaico, o sangue não haveria manchado o Sudário. Também aqui há uma convergência com a descrição bíblica, que sugere um apressamento dos ritos funerários, devido à aproximação do Shabat ( sábado ), o dia do repouso judaico, que começa a ser contado a partir do crepúsculo da sexta-feira. A proximidade entre o queixo e o peito, na imagem formada no Sudário, deve-se ao fato da cabeça do morto ter sido apoiada sobre um suporte. Embaixo, o corpo envolto no lençol. E o Sudário - sem o seu conteúdo -·encontrado pelos discípulos.
Os Ícones - Feições Semíticas e Barba
A face
de Cristo em reconstituição tridimensional
Por volta do século 4, ocorre uma mudança radical na representação artística de Cristo. Ele deixa de ser mostrado como um homem sem barba, com penteado romano, e passa a ser representado com feições semíticas e barba. Isso coincide com a descoberta do chamado Mandylion de Edessa, que muitos pesquisadores identificam com o Sudário.
Uma das primeiras obras artísticas dessa nova fase é o Cristo Pantocrator do Sinai, pintado no século 6 e conservado até hoje no mosteiro de Santa Catarina, no Egito. Esse ícone ainda impressiona pelo realismo, beleza e majestade. Utilizando uma sofisticada técnica de superposição de imagens, o pesquisador americano Alan Whanger, da Universidade de Durham, na Carolina do Norte, obteve nada menos do que 170 pontos de congruência entre sua figura e a face impressa no Sudário. Isso sugere que, mais de sete séculos antes da época atribuída ao Sudário pela datação do carbono 14, o artista que pintou o ícone pode tê-lo utilizado como modelo.
Ainda mais impressionantes são os 250 pontos de congruência existentes entre a imagem do Sudário e o chamado Cristo Pantocrator de Dafne, um mosaico bizantino que domina a cúpula da igreja do Mosteiro de Dafne, situado entre Atenas e Elêusis, na Grécia. Ele foi produzido por volta do ano 1100 - portanto, de 160 a 290 anos antes das datas estabelecidas pelo carbono 14.
Ainda agora, no século 21, o pano que inspirou essas obras de arte continua desafiando a inteligência humana. A seu respeito foram escritos mais de 500 livros. E ele já foi investigado pela ciência como nenhum outro objeto existente na Terra. Cada nova tecnologia desvendou nele um detalhe ainda mais surpreendente. Seu mistério e fascínio parecem inesgotáveis.
O termo grego Pantocrator pode ser traduzido como " Todo Poderoso" . A figura do Cristo Pantocrator é o tema mais difundido na arte bizantina
Consultores
Esta
reportagem contou com a inestimável consultoria de dois pesquisadores
brasileiros do Sudário: o cirurgião buco-maxilo-facial Nobol Fukushima e a
psicóloga e teóloga Maria Beatriz Ribeiro Gandra. A eles os nossos agradecimentos.
Anote
Livros
- O Sudário, de Emanuela Marinelli, Ed. Paulus
- A Verdade sobre o Sudário, de Kenneth Stevenson e Gary Habermas, Ed. Paulinas
- O Santo Sudário, de Ian Wilson, Ed. Melhoramentos
- The Mysterious Shroud, de Ian Wilson e Vernon Miller, Ed. Image/Doubleday
- Sindone, la Prova, de Pierluigi Baima Bollone, Ed. Mondadori
Internet
- https://www.shroud.com
A Saga do Lençol, dos Discípulos aos Cavaleiros Templários
Um longo intervalo separa a morte de Jesus da aparição do Sudário na França, em 1356. Essa lacuna é preenchida quando se associa o lençol ao Mandylion, uma relíquia venerada em Bizâncio durante séculos. Que objeto era esse? Diz uma lenda que o próprio Jesus enviou a Abgar V, soberano de Edessa (atual Urfa, na Turquia), um retrato seu, criado milagrosamente, quando enxugou o rosto numa toalha. Esse pano, conhecido como Mandylion, serviu de modelo para a arte bizantina. Vários pesquisadores crêem que o Mandylion era o próprio Sudário. Para ocultar sua natureza de lençol mortuário, seus guardiões o dobraram e puseram num relicário, deixando visível apenas o rosto. Essa hipótese explica a semelhança existente entre os ícones bizantinos e o Sudário. E permite construir a seguinte cronologia:30 d.C. - morte de Jesus. O discípulo Tadeu leva o Sudário a Edessa;
57 - perseguição aos cristãos em Edessa. O lençol é escondido num nicho;
525 - inundação de Edessa. Durante a reconstrução, o Mandylion é descoberto;
639 - conquista de Edessa pelos muçulmanos. O culto ao Mandylion é preservado;
943 - cerco de Edessa pelos bizantinos. Estes prometem poupar a cidade em troca do Mandylion. Após muita relutância, os muçulmanos entregam a relíquia;
944 - chegada triunfal do Mandylion a Constantinopla;
1201 - um inventário de relíquias bizantinas refere-se claramente ao Sudário;
1204 - os cruzados saqueiam Constantinopla. O Mandylion (ou Sudário) é ocultado pela Ordem dos Cavaleiros Templários;
1306 - Jacques de Molay, grão-mestre da ordem, leva o tesouro dos templários para a França;
1314 - os templários são queimados como hereges;
1356 - Geoffrey de Charny, parente de um dos mestres templários, doa o Sudário à igreja de Lirey;
1357 - primeira exposição pública do Sudário na França.
FONTE: https://galileu.globo.com/edic/99/con_sudario4.htm
Adaptado por Rockefeller Silva ( rockefeller.silva@gmail.com )